O transporte público americano está em uma triste situação, com sistema antigo, subfinanciado e perdendo passageiros, principalmente desde a pandemia do Covid. Muitos propuseram soluções focadas em novas tecnologias, como carros autônomos (sem motorista) e taxis voadores. Mas, como pesquisador em políticas urbanas e planejamento, vejo mais promessas de curto prazo em um modelo que está disponível há um século: o ônibus urbano.
PORQUE O ÔNIBUS É A CHAVE PARA O TRANSPORTE PÚBLICO AMERICANO
Atualmente, em muitos locais dos EUA, os ônibus são velhos e não rodam com a frequência suficiente e nem servem todos os lugares que as pessoas precisam ir. Porém, isto não reflete a verdadeira capacidade dos ônibus. Pelo contrário, é o resultado do fracasso de líderes de cidades, estados e federação em subsidiar serviços públicos de qualidade.
Como mostro em meu novo livro “O Grande Desastre Americano de Trânsito: Um Século de Austeridade, Planejamento Centrado em Carros e Êxodo Branco”, poucos políticos norte-americanos focaram nas experiencias dos passageiros de ônibus na última metade do século. E muitos executivos esbanjaram precioso capital federal em construir novas e rápidas linhas de trilhos leves, na esperança de atrair passageiros suburbanos de volta ao centro da cidade e ao transporte de massa. Porém, esta nunca foi uma grande estratégia para começar, e a era pandêmica dos trabalhadores atuando em home-offices e programações híbridas mostrou o pouco valor dos esforços de décadas de centralização de trilhos. Entretanto, países na Europa e América Latina inovaram acima dos EUA proporcionando serviços de ônibus de qualidade.
Ainda assim muitas cidades americanas consideram que os ônibus são o futuro do transporte público e estão trabalhando para isto se tornar realidade. E a Lei Bipartidária da Infraestrutura promulgada em 2021 está proporcionando bilhões de dólares para novos ônibus e instalações relacionadas.
O sistema de transporte norte-americano centrado em carros empobreceu o transporte público e deixou as pessoas insatisfeitas com transporte.
ÔNIBUS COMO DISRUPTORES
Um século atrás, os ônibus motorizados era a melhor tecnologia da época. Rodando rapidamente sobre pneus em ruas recém pavimentadas, os ônibus mudaram o trânsito urbano liberando os passageiros dos bondes envelhecidos, barulhentos e lotados. Em 1922, os ônibus americanos carregaram 404 milhões de passageiros, e em 1930 eles carregaram 2,5 bilhões de passageiros por ano.
Executivos de transportes, tentando obter lucros, viam os ônibus como um meio de reduzir gastos na manutenção de trilhos e custos de trabalho para os bondes operados por dois homens. Planejadores e líderes das cidades também abraçaram a ideia dos ônibus, que os ajudou a remover os trilhos dos bondes, tornando as ruas melhor trafegáveis para carros.
Isto não foi apenas uma tendencia norte-americana. Toronto expandiu uma massiva rede de ônibus ao longo da área metropolitana entre 1954e 1974, usando os ônibus para alimentar vias suburbanas em um novo sistema de metrô e permaneceram algumas linhas de bondes. Em 1952, gestores de Londres substituíram os bondes pela icônica frota de ônibus de dois andares, que completava seu lendário serviço de metrô. Os simbólicos ônibus vermelhos de Londres cobriram toda a cidade, oferecendo serviços de 24 horas em várias linhas.
Na Europa, as cidades confiaram nos ônibus para apoiar e modernizar suas redes de metrô e trens urbanos. Lideranças políticas proporcionaram bons subsídios para entregar melhores serviços de ônibus e trilhos.
Nos EUA, naquela época, a maioria das empresas de transporte eram de propriedade privada.Mas este modelo fracassou quando os passageiros de ônibus se tornaram motoristas de carros, novas leis de zoneamento priorizaram residências unifamiliares com carro. Além disso, regulamentações governamentais penalizaram as empresas de transportes com impostos e taxas.
O CAMINHO NORTE AMERICANO CENTRADO EM CARROS
Nos EUA, entretanto, investimentos federais ao mesmo tempo focaram em construir um sistema nacional de vias expressas para atender os automóveis particulares. Sem subsídios, as redes de ônibus não puderam competir com os carros baratos e as rodovias financiadas pelo governo. Ônibus antigos e serviços com pouca frequência se tornaram referencia da realidade pós-guerra; e os ônibus tiveram que viajar em ruas locais lotadas de automóveis particulares.
Entre 1945 e 1960, as agências e companhias americanas de transportes perderam metade de seus passageiros quando americanos brancos se mudaram para periferia ou subúrbios e se tornaram usuários de carros. Os serviços de ônibus permaneceram concentrados nos antigos arredores centrais, servindo desproporcionalmente passageiros não brancos e com baixa renda.
Muitos sistemas públicos tiveram que cortar os serviços ano após ano para equilibrar as contas. Sendo assim, apenas algumas cidades que fizeram significativas operações de subsídios, incluindo São Francisco e Boston, foram capazes de manter melhores redes de ônibus e alguns troleibus. Los Angeles teve um sistema de transporte público de alta qualidade, centrado em bondes.

ÔNIBUS NOVOS PARA MELHORAR O TRANSPORTE PÚBLICO AMERICANO
Atualmente há renovados interesses em aprimorar os serviços de ônibus nos EUA, inspirados em inovações ao redor do mundo. A cidade brasileira de Curitiba, que é bem conhecida por sua inovação no planejamento urbano, lançou um modelo na década de 70 onde adotou o BRT bus rapid transit – ônibus que rodam em linhas dedicadas, com sistema de embarque simplificado e prioridade nos sinais de trânsito.
Assim, Curitiba ajudou a popularizar os ônibus biarticulados, que são extra grandes com conexões flexíveis permitindo que se dobrem nas esquinas. Estes ônibus, que podem carregar um grande número de pessoas, atualmente são muito usados na Europa, América Latina e Ásia.
As cidades ao redor do mundo, lideradas por Londres, expandiram agressivamente o sistema de pagamento sem contato, que acelera o processo de embarque. Sistemas avançados de ônibus e novas tecnologias como esta florescem em regiões onde há fortes políticas de apoio ao transporte público.
Na minha opinião, os ônibus são a opção mais provável para expandir substancialmente o número de passageiros de transporte público nos EUA. Afinal, milhões de americanos necessitam de mobilidade pública acessível para trabalhar, estudar, lazer e compras.
Além disso, possuir um carro é um fardo financeiro que pode ser tão sério para as famílias de baixa renda quanto a escassez de moradias populares. O custo médio anual para os domicílios americanos possuírem e utilizarem um carro novo chega em US$10.728 em 2022. Os preços dos carros usados são altos, financiamento é geralmente subprime e costumam requerer manutenções caras.

RÁPIDA EXPANSÃO DE REDES DE ÔNIBUS
A expansão rápida de redes de ônibus seria o meio mais rápido e econômico de atender estas famílias e, além disso, aumentar o número de passageiros de transporte no amplo cenário de metrôs americanos.
Há modelos domésticos promissores mesmo entre a crise de números de passageiros da pandemia. Nas duas últimas décadas, a empresa de trânsito de Seattle melhorou sua rede de ônibus, alinhando as melhorias com aumento de densidade residencial, taxas baixas e cuidadosa expansão de linhas de trilhos leves.
São Francisco e Nova York desenvolveram faixas de ônibus exclusivas de altas velocidades em rotas populares. Indianápolis está expandindo um eficiente sistema de BRT. Muitas cidades, inclusive Denver e Boston, estão investindo em atualizações de melhores ônibus que enfatizam na frequência do serviço, fácil transferência e melhor cobertura geográfica.
Por fim, inovações como estas somente terão sucesso a longo prazo com suficientes subsídios para manter os serviços inovadores em níveis confiáveis. A história americana do transporte por ônibus está em vários programas piloto que foram abandonados por questões de custos quando estavam ganhando popularidade.
Os ônibus não precisam ser mais rápidos ou mais convenientes do que os carros para atraírem pessoas. Entretanto, eles necessitam ser, e podem ser, uma opção de trafego muito melhor do que são hoje.
Fascinados por Transportes
Fonte: Nicholas Dagen Bloom. Why the humble city bus is the key to improving US public transit. Publicado em 02. março.2023. The Conversation. Disponível em: https://theconversation.com/why-the-humble-city-bus-is-the-key-to-improving-us-public-transit-199052
Leia também: https://fascinadosportransportes.com.br/onibus-de-madrid/
Saiba mais: https://fascinadosportransportes.com.br/transporte-publico-em-singapu